Tenho a sensação de que já estive aqui. Já estive aqui. Sinto um cheiro no ar que me sabe a tardes em casa da avó, à canela em cima do arroz doce. Ouço os sons que me lembram de ti, as cigarras e o silêncio. Pairam várias coisas no ar, e algumas delas eu não sei que lhes dizer. Elas estão aqui, e esperam que eu converse com elas. Esperam que eu lhes conte algumas histórias, que lhes fale de ti. Que lhes diga que gosto de ti, porque gosto, que lhes conte a que sabes, a que cheiras. Que lhes conte aquilo que sinto quando estou contigo, ou quando estava. Mas eu não sei. Não sei se estive contigo ou com qualquer outra personagem que criei dentro da minha própria alma, e agora já não cabe lá, nesse sítio onde eu gostava de viver para sempre e é rejeitado por outros. Não percebo. Ainda hoje não percebo. Sinto que já estive aqui, já me senti aqui noutro dia em que não me conheci, nem a ti. Hoje não te conheço, nem sei quem és ou onde estás. Quero dizer: onde estás? O que te levou a sair? Porque é que me deixaste aqui, perdida sem ti? Eu não sei de nada sem ti. Estou perdida, se calhar. Quando é que voltas para me encontrar? Onde é que foste? Diz-me. Eu nunca te pedi, eu nunca quis.