18.2.11

despedidas de ti.


Acordei com uma mensagem tua. Era muito cedo. Não sabia que horas eram ao certo, mas sabia que era cedo. Ouvi o telemóvel vibrar em cima da mesa-de-cabeceira e rapidamente agarrei nele, o desbloqueei e li a mensagem. Pedias-me que fosse ter contigo. Era muito cedo para me pedires que fosse ter contigo. Deixaste-me preocupada. Levantei-me muito depressa. Tomei banho, vesti-me, calcei-me, agarrei nas chaves e saí. Saí sem tomar o pequeno-almoço, saí sem avisar a minha mãe. Na mensagem, pedias-me que fosse urgentemente ter contigo à beira-mar. Enquanto andava pela rua, não vi ninguém, e as pessoas estavam todas lá. Não ouvi nada, e o barulho era tanto. Só me lembrava da tua mensagem, de ti. Só pensava no que teria acontecido, porque é que me tinhas chamado ali. Logo ali, tão cedo. Depois, ainda ao longe, vi-te sentado num banco de madeira. Os teus olhos cruzavam-se com o azul do mar. Não estavas a sorrir, mas parecias bem. Os teus cabelos esvoaçavam por causa do vento, e tinhas a tua mochila pousada ao teu lado. Tive medo. Aproximei-me mais de ti e, assim que me viste, levantaste-te e beijaste-me a bochecha. Com a tua mão, pediste-me para que me sentasse contigo. Eu sentei-me ao teu lado, e não disse nada. O vento teimava em fazer o meu cabelo esvoaçar. Tentei fazer com que ele voltasse ao sítio, mas sem sucesso. De repente, tu disseste: Não mexas mais. Deixa-te estar assim, estás linda. Senti as bochechas a aquecer, e perguntei-te porque é que me tinhas chamado ali. Tu levantaste-te. Começaste a andar de um lado para o outro, e por fim pousaste os braços na estrutura de ferro atrás do banco onde eu estava. Deixaste-me ainda mais preocupada. Estava sem saber o que pensar, sem saber o que dizer ou fazer. Apertei as mãos uma contra a outra, e coloquei-as entre as minhas pernas. Estavam frias, tão frias. O que é que se passa? Insisti. Sentaste-te ao meu lado e, com as tuas mãos, agarraste as minhas. Notaste que estavam frias. Apertaste-as com força. Começaste a falar, enquanto me olhavas nos olhos. E olhaste-me tão fundo que tive medo que descobrisses os meus segredos mais bem guardados. Vou ter que sair da cidade por uns dias, preciso de resolver uns assuntos por lá. Com o meu pai, tu sabes. Uns dias, mas não sei quantos. Podem ser três, ou trinta. Eu não sei. Percebi imediatamente que terias mesmo que ir, e que não te podia impedir. Não tinha sequer o direito. Depois do que me disseste, percebi porquê toda aquela urgência. Conhecia-te tão bem. Eu só tinha que te deixar ir. Demorasse o tempo que demorasse, tinha que ser. Ligo-te todos os dias. E eu sabia, sabia que ias ligar, porque nunca me tinhas faltado a nenhuma promessa. Nunca me tinhas deixado mal. Confiei em ti, e depois tu disseste: Eu gosto muito de ti, sempre. E eu tive medo. Tive ainda mais medo do que quando me aproximei de ti. Tive medo, porque estando longe o sempre pode perder o sentido. Mesmo connosco. Apertei as tuas mãos com muita força, e no nosso silêncio pedi-te que não fosses. Tu olhaste para mim, ternamente, como quem diz que não pode mesmo ficar. Levantaste-te devagar, e só aí é que eu percebi que ias naquele momento. Não era à tarde, nem à noite, nem depois. Ias já. E então eu chorei, e tu choraste comigo. Abracei-te, depois, com a força com que gosto de ti. Podias voltar no dia a seguir, no próximo Domingo à tarde ou dois meses depois, quando já fosse Primavera e os passarinhos cantassem só para nós. Eu iria ficar para sempre ali, mesmo que fosse só em pensamento. Aquele lugar dava-me tudo. Conheci-te naquele mesmo sítio, o mar foi o nosso maior amigo, e agora estava a despedir-me de ti ali mesmo, sem saber quando voltava a ver-te. Larguei-te, deixei-te ir, fui obrigada a deixar-te ir. Quando pensares em nós, naquele momento, no mar e no nosso sítio, não te esqueças de que aquela foi a despedida que me custou mais. Até hoje. Quando te larguei a mão, e tu começaste a andar, caiu-me tudo ao chão. E eu tive vontade de cair também, mas mantive-me de pé. Por ti, por mim e por nós. Porque, ao ires embora, levavas contigo tudo de mim, e não poderias levar um coração despedaçado.

2 comentários:

  1. este texto não me desiludiu em nada. está lindo mesmo, derreto-me com cada palavra. tens tanto jeito para as palavras, inês.

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  2. oh, és uma fofinha. escrevemos as duas bem, e nem se fala mais nisso. fico mesmo feliz por saber isso, inês, mesmo muito.

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